O pensamento de Ficino é totalmente subordinado aos dogmas católicos. Ele procurou fazer de em sua obra uma composição do pensamento de Platão com a fé cristã. Segundo Kristeller:
"Ficino revisou intencionalmente o esquema platônico, em parte para fazê-lo mais simétrico, em parte para dar à alma humana um lugar privilegiado em seu centro, dando assim uma espécie de sanção metafísica à doutrina de dignidade do homem, que herdou cie seus predecessores humanistas. A alma é verdadeiramente o fim de todas as coisas criadas por Deus. É a intermediária entre os seres mais altos e os mais baixos, compartilhando alguns de seus atributos com os primeiros e outros com os últimos." [1]
Uma chave para o entendimento de concepção de Amor de Ficino e de todo o seu pensamento está na sua idéia de superioridade da Vida Contemplativa sobre a Vida Ativa. Segundo Kristeller:
"Se pode dizer que toda sua doutrina moral. tal com está expressa em suas cartas. é uma redução das regras especificas do valor da vida contemplativa. ... sua doutrina da imortalidade da alma é um complemento e conseqüência necessária de sua interpretação da existência humana e da meta da vida humana. Se nossa tarefa básica é ascender, através de uma série de degraus, à visão e ao gozo de Deus. temos que postular que esta meta ultima será alcançada. não somente por algumas poucas pessoas e por um curto tempo, mas por um grande número de seres humanos e para sempre. De outra maneira, o esforço do homem para alcançar este fim último seria em vão" [2]
Na sua teoria sobre o Amor, Ficino reinterpretou "O Banquete" e "Fedro" de Platão, combinou-os com teorias mais antigas sobre a Amizade, de Cícero e Aristóteles, alguns tópicos do amor cortesão de Dante e Guido Cavalcanti e tratou de identificar outras influências com o amor cristão (charitas) proclamado por São Paulo ("Amarás ao próximo como a si mesmo"). De sua interpretação do Amor de Platão foi cunhado o termo "amor platônico", associado por Ficino algumas vezes ao amor divino.
O ponto básico é a interpretação do amor por outro ser humano simplesmente como uma preparação. mais ou menos consciente, para o verdadeiro amor, o amor de Deus, que constitui a meta real do desejo humano, e que apenas se volta para as coisas e pessoas pelo esplendor refletido nelas da beleza e da bondade divinas. Ficino insiste que o amor e a amizade verdadeiros são sempre mútuos e que uma relação genuína entre duas pessoas é uma comunhão fundado no essencial do homem, a saber o amor divino. Nunca pode haver isoladamente dois amigos, sempre tem de haver três, dois seres humanos e Deus. Só Deus é o laço indissolúvel e o guardião perpétuo de toda amizade verdadeira, porque um amante verdadeiro ama a outra pessoa unicamente por causa de Deus. Segundo Kristeller:
"O amor e a amizade verdadeiros entre várias pessoas se deriva do amor do individuo por Deus, e se reduz ao fenômeno básico da ascensão interior, que constitui o núcleo da filosofia de Ficino." [3]
O Amor é o elemento que permite a ascensão da alma em direção aos seres mais altos. O ideal a ser atingido segundo Ficino é o do visionário cristão. Assim o delírio divino é o componente de maior importância, estando acima da busca racional do conhecimento. Ficino reinterpreta as quatros formas de delírio discutidas por Platão no Fedro, associando o delírio poético inspirado pelas Musas ao exemplos de inspiração de Davi e Salomão, o delírio profético/apolíneo à Moisés e ao Antigo Testamento, o místico pagão de Baco ao Novo Testamento e o delírio do amor de Afrodite ao amor de Cristo e São Paulo. Destas quatro formas o furor amatorius, o Amor, é o mais poderoso e sublime.
A compreensão do mundo deve ser feita pela apreensão intuitiva, e não pela realização racional dos valores eternos. A beatitude temporal está aberta para todo aquele que "seriamente dedique a sua Mente à busca do verdadeiro, do bom e do belo", mas a felicidade perfeita só se atinge nos raros momentos em que a contemplação se eleva ao êxtase. A importância da fé sobre a razão mostra a influência de Agostinho sobre o seu pensamento.
A ideia do Amor é a força motriz do sistema filosófico de Ficino, a causa pela qual Deus derramou a Sua essência sobre o mundo e a causa de que as Suas criaturas procurem a união com Deus.
Para Ficino há três espécies de Amor: o Amor Divino, o Amor Humano e o Amor Bestial (amor ferinus). O primeiro é representado no homem pela seu Intelecto e pode ser atingido através dele ou pelo delírio divino (a graça de Agostinho). O segundo é representado pelas outras faculdades da alma humana. O último é o amor carnal, associado à Loucura.
O amor é sempre desejo, mas nem todos os desejos são amor. Quando o desejo não está em contato com potências como a cognição, não passa de uma simples necessidade natural, como a força cega que faz com que a pedra caia. Só quando o desejo á associado com a virtude é que se torna consciente de um fim último, merecendo o nome de Amor.
Bibliografia
[1] Paul Kristeller, "Ocho filósofos del Renacimiento italiano" e "II Pensiero Filosofico di Marsilio Ficino".
[2] Paul Kristeller. "Ocho filósofos del Renacimiento italiano"
[3] Idem.
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