segunda-feira, 5 de agosto de 2019

A Visão do Amor em "Fedro" de Platão

Nesta obra Platão desenvolve as idéias sobre o Amor apresentadas no Banquete. Uma importante noção nos é apresentada sobre o delírio. Segundo Sócrates há dois tipos de delírio, um que nasce da modéstia e outro do estado divino que nos leva além das regras habituais. O delírio do Amor é do último tipo, sendo assim divino. O delírio divino é de quatro espécies: um é o sopro profético de Apoio, outro a inspiração mística de Dionísio; o terceiro, o delírio poético inspirado pelas Musas, e finalmente, a quarta espécie de delírio era devida à influência de Afrodite e de Eros. 

O delírio causado pelo Amor é superior aos outros. Ele alimenta as asas do espírito e permite a ascensão da Alma. Esta noção nos é apresentada através do mito da parelha alada. Através desta metáfora Platão faz uma composição da função do Amor com as noções do Mundo das Idéias, Imortalidade da Alma e da ideia de Reminiscência, apresentadas principalmente no Fédon através do mito da caverna; e a sua cosmologia. apresentadas principalmente no Timeu. O Amor seria um dos agentes que permitiria à alma atingir o mundo das idéias. A seguir apresentamos o mito da parelha: 

"A alma pode ser comparada com uma força natural e ativa que unisse um carro puxado por uma parelha alada e conduzida por um cocheiro. Os cavalos e os cocheiros das almas divinas são bons e de boa raça, mas os dos outros seres são mestiços. O cocheiro que nos governa, rege urna parelha, na qual um dos cavalos é belo o bom, de boa raça, enquanto que o outro é de má raça e de natureza contrária. Assim conduzir nosso carro é oficio difícil e penoso. A alma universal rege a matéria inanimada e manifesta-se no universo de múltiplas formas. Quando é perfeita e alada, plana nos céus e governa a ordem universal. Mas quando perde as suas asas, rola através dos espaços infinitos até juntar-se a um sólido qualquer e ai estabelecer o seu pouso. Quando reveste a forma de um corpo terrestre, este começa, graças à força que lhe comunica a alma, a mover-se. É a este conjunto de alma e de corpo que chamamos de ser vivo e mortal. A força da asa consiste em conduzir o que é posado para as alturas onde habita a raça dos deuses. A alma participa do divino mais do que qualquer outra coisa corpórea. O divino é belo, sábio e bom. Por meio destas qualidades as asas se alimentam e se desenvolvem enquanto que todas as qualidades contrárias, como o que é feio, o que é mau, a fazem diminuir e fenecer. Quando se dirigem para o banquete que os espera, os carros sobem por um caminho escarpado até o ponto mais elevado da abóbada dos céus. Os carros dos deuses que são mantidos em equilíbrio, graças a docilidade dos corcéis, sobem sem dificuldade. Os outros grimpam com dificuldade porque o cavalo de má raça inclina e repuxa o carro para a terra. Há então grande trabalho para a alma. Elas tudo fazem para seguir os deuses, erguem a cabeça do guia para a região exterior e se deixam levar com a rotação. Mas, perturbadas pelos corcéis do carro. apenas vislumbram as realidades. Ora levantam, ora baixam a cabeça, e, pela resistência dos cavalos, vêem algumas cousas mas não vêem outras."

O Amor permite a germinação das asas. Daí um outro nome de Eros ser "aquele que dá asas". A alma é atraída para céu da Verdade, pelo Mundo das Idéias, pela lembrança da Beleza que guarda do convívio anterior com este mundo. O desejo pelo amado está associado a este desejo de volta ao mundo das idéias, e nos traz a reminiscência da beleza daquele mundo: 

"A razão que atrai as almas para o céu da Verdade é porque somente ai poderiam elas encontrar o alimento capaz de nutri-las e de desenvolver-lhes as asas, aquele que conduz a Mama para longe das baixas paixões. (...) ao ver um rosto divino ou um corpo que bem reproduz a beleza, (o amante) sente certa estranheza, e um pouco da emoção de outrora e volta, pois, a olhar esse belo corpo, adora-o do mesmo modo que a um deus. Quando contempla o seu amor, apodera-se do amante uma crise semelhante a lebre: modificam-se-lhe os traços do rosto, o suor aparece em sua fronte e um calor não conhecido corre pelas suas veias. Logo que recebe, através dos olhos, a emanação da beleza, sente esse doce calor que alimenta as asas da alma. Esse calor funde o que impedia (...) a germinação (das asas). (...) A alma, quando as asas começam a desenvolver-se. ferve, infla e sofre da mesma maneira como padecem as crianças que, ao receberem novos dentes, sentem pruridos e irritação nas gengivas. Também a alma fermenta. padece e sente dores, ao lhe crescerem as asas (...) Mas quando está separada do amado, fenece. E as aberturas pelas quais saem as asas, também murcham e. fechando-se, impedem a germinação da asa, que, presa no interior justamente com a vaga do desejo palpitando nas artérias. faz pressão em cada saída sem abrir caminho. Deste modo a alma toda, atormentada por todos os lados. sofre e padece, e no seu frenesi não encontra mais repouso. Impelida pela paixão. ela se lança á procura da beleza. Quando a revê ou a encontra de novo, reabrem-se-fite os poros. A alma respira novamente e já então não sente o aguilhão da dor e goza, nesses poucos instantes, da mais deliciosa volúpia" 

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